“OS SONHOS, AS ARTES E OS
MITOS FALAM SOBRE A MESMA COISA” (Joseph Campbell)
Freud encontrou primeiramente nos mitos a estrutura de seu campo de pesquisa
com a teoria psicanalítica baseado no mito Grego de Édipo. Depois Jung apresentou ao mundo uma releitura de Platão com a
definição de arquétipo usando histórias
mitológicas como ferramenta para investigar o mundo inconsciente da psiquê
em busca de regiões ocultas onde estivessem gravadas imagens naturalmente
típicas do desenvolvimento humano no universo inteiro.
Definir mito e mitologia talvez seja tão complexo como definir a
jornada humana na face da terra. Há ainda quem a entenda como indefinível,
em função do seu poder urobórico( ) de
se metamorfosear.
Uma das maneiras de ver o mito é como uma tentativa de explicar os
questionamentos humanos e suas dúvidas intrigantes enquanto encarnados no
planeta . As histórias da mitologia são imantadas pelo sagrado e tratam dos
modelos perpétuos de comportamento da alma humana
Afinal existe um marco que define
o início da mitologia como hoje a entendemos nas nossas vidas? Não é tão
simples assim. Não há um evento ou marco específico, tampouco um conceito
claro.
O início pode ter uma relação com a passagem da humanidade de coletor e
caçador para a agricultura. A partir daí parece haver uma conexão
maior com o Cosmos e os acontecimentos e fenômenos naturais ao seu redor.
O poder da lua parece começar a exercer um fascínio e respeito. A figura Lunar,
comportando a luz e o poder do Sol, lentamente foi limitando o poder da terra
através de suas efêmeras fases e aos poucos foi sendo associada com a
fertilidade. Muitos ritos passaram a acontecer para que as colheitas
acontecessem. A primavera passou a ser associada a fecundação, o verão a
colheita e o inverno ao sacrifício. E é a partir desta mistura de eventos naturais e forças sobrenaturais e o fenômeno da colheita
que começaram as primeiras adorações que se tem notícia
venerando a Deusa da fertilidade da terra.
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Deusa da terra fertilizada
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Mesmo avançando além do aspecto agrícola, a mitologia passou a estar
presente em diversas áreas da vida em sociedades, assim como diretriz na
história da arte.
O que hoje conhecemos por mitologia clássica Greco-Romana (que é o
conjunto de mitos mais popular do mundo) começou com histórias mágicas,
sobrenaturais, alegóricas, devassas, selvagens, absurdas, primitivas,
intolerantes. Histórias verdadeiras que aconteceram no início dos tempos e
outras inventadas como veremos adiante. A finalidade era responder algumas
perguntas como:
Qual a origem do Cosmos?(mito existente para dar uma razão,
explicar o desconhecido)
De onde vem o trovão e o relâmpago? Para onde
vamos após a morte?(mito explicativo)
Porque escurece quando o Sol desaparece?
Qual a origem da humanidade na terra?
Porque as pessoas se enamoram?
Qual a
origem das constelações?
Como o fogo passou a existir?
Qual o significado das
doenças e da dor?
Entender o comportamento de certas criaturas,
a mudança
das estações, e outras tantas perguntas.
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Caronte o barqueiro
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Como não dispunham da ciência e da
tecnologia para dar as explicações, extrapolavam na criatividade das respostas
que criavam. Diferente de muitas religiões que surgiram posteriormente, a
relação Humanos e Divindades nem sempre eram harmônicas, mas muitas
vezes guiada pela emoção, o que resultava em uma relação muitas vezes
dramática. Talvez por isso a mitologia tenha tantas tragédias, guerras,
paixões, céu, paraíso, inferno, futuro, passado, heroísmo, fúrias, traições,
vinganças.
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Zeus e Leda
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A mitologia serviu de base para preencher os mais variados
questionamentos lacônicos.
“As imagens, os mitos e os símbolos estão ligados às mais secretas
modalidades do ser” (Mircea Eliade)
Uma das maiores dificuldades em entender a mitologia é a questão do
tempo. Na Cosmogonia Cristã há um tempo linear com começo, meio e fim
representados ou significando respectivamente: gênese, encarnação e apocalipse.
Nos mitos não há necessariamente uma narração contínua e menos ainda um tempo histórico cronológico de pensar de
forma linear. O tempo mítico é atemporal auto-suficiente em sua própria
dimensão. Muitos de nós já ouvimos aquela máxima”O Tempo dos Deuses é diferente
do tempo do homens”
Os seres humanos são muito muito semelhantes entre sí. Semelhantes
nos corpos, nas aflições, nos contentamentos, descontentamentos e
comportamentos.
Talvez não nos seja possível imaginar o vasto significado da
mitologia para as civilizações antigas, mas podemos sentir e entender de
maneira semelhante as imagens arquetípicas dos mitos, pois
eles representam modelos psicológicos e cósmicos. Podemos comparar a um espelho
onde nos vemos como realmente somos.
Ao entender os seus significados temos uma
pista para entender mais a humanidade nas mais remotas culturas e as
ferramentas para nos tornarmos conscientes da nossa existência.
Joseph Campbell foi uma das maiores autoridades mundiais em mitologia e utiliza o fenômeno do heliotropismo, que é o
movimento das plantas na direção dos
raios solares para comparar a possibilidade do efeito da mitologia em nós.
Através do mitos podemos voltar-nos para um nível espiritual de consciência, o
que não deixa de ser uma alusão a nos voltarmos na direção do Sol, o astro que
na astrologia representa a consciência
Esta consciência que Campbell se refere nos mostra o quão é
importante o conhecimento de nossa mitologia pessoal, da nossa história de vida
transpessoal e sagrada.
A falta deste entendimento pode ser o que faz com que
tantas pessoas elejam heróis, atores, músicos, intelectuais, políticos,
celebridades em geral para idolatrarem. Arriscam-se assim a viver a vida através das experiências dos outros, ou
vendo a vida através da nuance das sombras como no mito da caverna
de Platão. Viver a sombra de mitos que não poderemos viver.
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